segunda-feira, 21 de janeiro de 2019

Segredos de liquidificador

Gosto de cozinhar, fazer bolos e doces, inventar drinques, sucos e batidas. Mas não aprecio o ficar horas na cozinha, costumo ser rápida e objetiva. Em quarenta minutos tudo deve estar pronto. Para cumprir a meta do tempo curto, os utensílios domésticos são essenciais e entre eles o liquidificador, usado para múltiplas receitas: panqueca, molho de tomate, bolo de cenoura, mousse de maracujá, batida de banana, piña colada.
Nunca pensei que o eletrodoméstico fosse perigoso como uma arma. Após a declaração do atual ministro da Casa Civil, me senti uma mãe negligente: nunca guardei liquidificador em cofre.
Em 1970, a gurizada podia brincar na rua sem medo. Vivíamos em um bairro residencial tranquilo na Zona Sul de Porto Alegre e quando ainda não frequentávamos escola ou em período de férias, fins de semana e feriados, passávamos, meus irmãos e eu, o dia inteiro pela calçada até escurecer ou a mãe gritar os nossos nomes completos. Não havia celular, computador e as horas dedicadas aos desenhos animados na televisão eram poucas, porque a calçada sabia ser muito mais animada! Pega-pega, Esconde-esconde, Polícia e Ladrão, As Panteras, Miss Brasil e Missa. As brincadeiras eram as mais diversificadas e sempre tinha uma briga no final, porque os sentimentos eram vividos de forma intensa.
Certa vez, nosso irmão vestindo a farda de policial, invadiu a nossa casinha de brinquedo, atirando com arma de espoleta. Cabe explicar que se tratava de um diminuto espaço de madeira pintado de cor de rosa com janelas brancas, onde tinhamos confiscado muitos pertences da cozinha de casa. Após levarmos muitos tiros, começamos a jogar todos os objetos que estavam ao nosso alcance com força na cabeça da autoridade. E assim quebramos o liquidificador novo da mãe, o que rendeu ferida grande na cabeça do atirador e castigo para todos de uma semana. E, claro, fazia parte do pacote, ouvir todas as noites, durante os sete dias, do pai e da mãe: sermões, palestras, discursos (não sei bem como nomear) sobre paz, amizade e tolerância.
Sim, o ministro tem toda a razão: liquidificadores e armas são igualmente perigosos. Mães e pais, por favor, fiquem atentos!

Crônica 2 - Oficina de Verão Santa Sede - janeiro 2019

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