terça-feira, 27 de janeiro de 2015

Sobre laços, avós, Invitro e emoções



      Sentou-se do meu lado no ônibus (sim, porque ônibus pode ser um bom local para observar os demais e escrever algo, o que é imprescindível para os escritores: o bisbilhotar a vida alheia, sem ser no Big Brother ok!)uma avó que trazia em seu colo uma neta, de uns cinco anos, da avó não importa a idade, mas o papel de avó.
    Hoje um calor fora dos padrões ventosos rio-grandinos, absurdamente calor e a avô a enlaçar os cabelos cacheados, negros e longos da menina que estavam em rabicó. A maneira como a avó formou um coque na menina me fez lembrar de minha avó: a delicadeza, a habilidade, o carinho, o gesto todo, a preocupação em refrescar o pescoço da menina. E como esta semana tô vivendo um momento cheio de emoções (porque não é só o rei Roberto que as têm) me invadiu uma saudade gigante da minha vó Olga. E conclui que na vida a gente recebe (por sorte!) amor de muita gente: filho, mãe, pai, marido, irmão, amigo, mas nada é ou será parecido ao amor de uma vó!
    E aí lembrei do meu vestido de noiva, que outro dia espiei encantada com o bordado a mão da minha vó na barra (que é muito ampla e as pérolas são minúsculas), ninguém no mundo, a não ser uma avó o faria. Claro as bordadeiras, as costureiras recebem, e muito, para fazê-lo. Minha vó, pelo contrário, pagou os tecidos e o feitio como presente de casamento à neta. E segundo ela, nunca viveu um dia de tanta angústia, passou todo o casamento atrás de mim: a arrumar o vestido e verificar os botões. Prometeu a si mesma que este seria o único vestido de noiva que faria (e foi mesmo!).
    E segui no ônibus pensando na proximidade do lançamento do Vitrais – contos do Invitro e daí a palavra lançamento me fez lembrar de laço este que nunca me desune da minha vó e que não tinha no meu vestido de noiva. Minha avó, a quem ouço quando estou cozinhando, e sigo o que ela manda, coloco os temperos enumerados, sei que pode parecer uma coisa maluca, mas é também um tanto linda e me passa de vez em quando, fruto do amor e do laço! E penso que minha avó já não estava neste mundo na noite fria erechinense do lançamento do Aroma Hortelã, mas tenho certeza que estava em algum cantinho a espiar. Ou seria do alto? E aí tem este outro livro chegando e pode parecer besteira a emoção, afinal já lancei livro individual, mas tem a história do laço que me enlaça ao grupo do Invitro, gente unida por identificação, carinho, vontade de fazer literatura, de fazer diferença, de contar algo, de emocionar, de criar um novo mundo, de transformar Rio Grande, de dominar o mundo, sei lá! Pra que mesmo que a gente escreve? Acho que a gente escreve para tentar sobreviver a um mundo que a gente não entende.
    Lembro quando voltei da primeira reunião do Invitro e disse pro meu marido (que notou minha alegria e ficou feliz comigo) que tinha encontrado uma turma de malucos como eu, porque acredito que escritor é mesmo este ser incompreendido. E agora aguardo a feira no sábado e sei que minha vó estará por lá como alguém que sempre acreditou em tudo, até nas minhas maluquices, porque também acredito que escritor é maluco!
     E que os laços sigam a nos unir e se fortaleçam cada vez mais, Invitrados lindos, e que as pessoas nos leiam nos Vitrais e se tomem pelo mesmo encantamento que nos enlaça à literatura e ao nosso mundo ficcional!

segunda-feira, 19 de janeiro de 2015

Zero na redação do ENEM: a culpa é de quem?



         Sempre que ocorre um resultado negativo em exames e seleções tem que haver um culpado. No caso do número assustador de candidatos que zeraram a redação no ENEM, todos apontam o dedo indicador e fazem cara feia para o professor de Língua Portuguesa. Ouso perguntar com todo respeito: em que idioma se comunicam os professores das demais disciplinas escolares com os estudantes?
       A responsabilidade com o ensino da linguagem não é apenas do professor de língua portuguesa e/ou redação, todos os docentes devem trabalhar com leitura e interpretação. A compreensão de um problema matemático é mais importante que o seu cálculo, já que somente entendendo o que está sendo perguntado o estudante será capaz de selecionar o cálculo a ser feito para obter o resultado correto.
       O estímulo à leitura de jornais, revistas, livros é tarefa de todo docente. O professor, seja ele de geografia, história, sociologia, filosofia, física, química, biologia, literatura não poderá ministrar suas aulas e aprofundar discussões oportunas com um grupo alienado e desatualizado.
       Mais fácil e cômodo é encontrar um único culpado, do que pensar sobre a realidade educacional de nosso país. O resultado dos zeros do ENEM se deve a um sistema que não investe em educação! A escola pública está deficitária e não é de hoje, mas a escola privada também não caminha bem. Os estudantes não encontram sentido na escola, não percebem a escola como um meio de melhoria de vida, muitos, infelizmente, estão ali apenas para receber a bolsa família! Na escola privada estão ali, mas também não sabem muito bem o que fazem naquele espaço que transformou-se em, tão somente, um ambiente de convívio social
      A responsabilidade familiar na formação do sujeito leitor e no incentivo aos estudos é primordial, porém cabe as escolas buscar a parceira com as famílias, a fim de que os pais entendam e auxiliem na constituição de um verdadeiro projeto educacional.
     O estímulo à leitura, apontado anteriormente, pode ser o começo do problema: será que o professor é um sujeito leitor? Será capaz de incentivar a leitura, alguém que não lê? A formação profissional de nossos educadores é deficitária e percebo tal realidade como professora que atua na formação de docentes há vinte anos. Infelizmente a profissão de professor é desvalorizada, mal paga, não tem status, os universitários que buscam os cursos de licenciatura, em sua maioria, são sujeitos sem vocação para o magistério e desqualificados para ingressar em outro curso superior. Claro, há exceções e por isto permaneço acreditando na educação!
      Enquanto não houver uma melhoria na remuneração dos docentes em todos os níveis de ensino na rede pública e privada a realidade não mudará. Enquanto não houver investimento em formação continuada, nada mudará. Parece haver uma luz no fim do túnel com o Pacto Ensino Médio, mas ainda é um pedacinho do que deve ser realizado como projeto educacional.
      O poder público deve repensar urgente o papel da educação na sociedade, não só para a redução dos zeros na educação, mas para a formação de um povo educado e ético!